Sem mais

Hoje eu só quero me declarar pro mundo.
- EU TE AMO!
Diria eu apaixonada.

Entregue,
de alma lavada.

REconhecendo

- Olá Vida! Me desculpe, não tinha reparado em você. Há quanto tempo está aí?

- Há 27 anos.

...

Eu procuro esperança em todo lugar.
Eu procuro alegria em todo lugar.
Eu procuro, procuro eu.
Procuro bons sentimentos sem descansar.

Tópico

Eu quero chorar.
Chorar até derreter. Chorar pra ver se a coisa ruim se dissolve e corre como um rio pra fora de mim.
Eu queria chorar.
Chorar por não conseguir acreditar mais em destino. Em sinais. Chorar porque meu avô se foi, meu cachorro se foi, e eu não vejo mais fadas. Chorar porque tenho muito cabelo branco, porque meu coração dispara e dói, porque eu não acredito mais nas pessoas. Chorar porque eu não queria crescer.  Chorar porque as vezes me sinto só, porque eu queria estar em outro lugar, porque eu sou muito mimada.
Eu quero chorar por não mais poder chorar por qualquer dor que eu sinta.
Chorar.
Apenas pelo prazer das lágrimas.

Regime

Quando a euforia é louca e o medo toma conta, tememos. O corpo treme entre a lingua, dentre os dentes. Entre o peito tudo geme, tudo é lento. O passo fica curto e apressado, a alma pesa, tem trezentos e trinta quilos. Eu tenho quinhentos e cinquenta quilos. Eu fico com oitocentos e oitenta quilos. E sinto a sobra de minhas gramas.

Bem no meu umbigo.

Memórias

Som de vela que se apaga. Vento, sinto, todo o tempo. Na minha pele calejada, na minha alma já fraca, no meu cabelo fino e branco. Na minha memória pequena, o meu suspiro profundo, talvez meu último. No meu ritmo lento, no meu passado ausente, me perco em presentes.

"Ontem mandei uma carta. Escrevi para minha família longe daqui. Escrevi como é a minha vida aqui. Escrevi contando como as moças são bonitas, como o clima é tropical, como a dança é quente. Sensual. Eu vi. Escrevi que sinto saudade do tempo em que eu usava saia rodada e sacudia na matinê. Escrevi de como eu costurava lindos vestidos. Escrevi que namoro escondido. Contei que sonho em ter filhos. Que quero estudar. Estou estudando. Ontem eu viajei, fiz curso de culinária francesa. Plantei feijão no algodão. Tomei chuva. Sabe que aprendi a ler? Eu li. Dou nó de marinheiro em cadarço. Decorei o nome de Dom Pedro I. Vi o sol nascer na Islândia. Tomei café com o José Silva, falei com a madame Gil. Abracei a estátua viva da rua, fiz amizade com um beija-flor, tive um sapato vermelho cereja. Falo português fluente, nado em mar aberto, saio caminhar. Ontem eu caminhei. Fui visitar minha mãe, minha vó, e eu."

Me vi nos olhos cansados de 93 anos.
Na imaginação de uma mente de 8.
No sorriso de um homem que tem a minha idade.

Vi minha vida inteira ali. Minha vida, antes mesmo de eu estar aqui.
E continuei a vê-la. Mesmo depois que eu partir.

Velório

O sol dilata a maneira de ver dos meus olhos, tudo clareia. Parece pirilampo no meio do mato, quando o mato tá grande e parece que tô vendo a lua sem lupa. Eu quero cheiro de chuva com sabor de saquê, pra me embriagar gostoso, pra deitar no colo manso do meu amor. Quero pegar no seu cabelo molhado, secar meu corpo no vento gelado. Eu quero novidade na ponta do pé pra poder dançar a noite inteira. Eu quero prosa mansa, daquelas que dá pra cantar baixinho e ainda sentir o gosto do descanso pela manhã.
Conquista.
Quero conquistar.
Quero ser conquistada BEM AO PÉ daquele Ipê amarelo florido que plantei com vocês, bem quando a gente tava junto.
Bem quando estávamos fracos, abraçados desde as raízes num luto.
Num luto mais que necessário.
Que já era esperado.
Num luto que jamais foi apagado.
Apenas superado.

Quando foi que eu me esqueci?

Delicadezas

O meu humor é tão estranho que chega a ser singelo e ao mesmo tempo ingênuo.
Sim, eu sou um romance vivo.

Que romântico!
(diria eu romanticamente ingênua numa das singelidades da vida.)